No último final de semana, assistimos aos filmes propostos pelo cineclube do Passaporte Cultural, e After Sun foi daquelas experiências que precisamos de algum tempo para digerir. É de uma beleza tão, tão simples, que é maravilhoso. Preciso contar aqui um pouquinho do que me pegou, e acho que ler essa breve resenha pode te fazer correr pra tela, se você ainda não assistiu.
✨Antes de qualquer coisa, vale reforçar que After Sun, dirigido por Charlotte Wells, demonstra, mais uma vez, a urgência de entregarmos um maior protagonismo às realizadoras de cinema, que até hoje contam com pouco espaço em uma indústria fortemente dominada pelos homens. Arrisco ainda dizer que a delicadeza construída nessa narrativa só é possível com uma mulher na direção.
O filme começa em ritmo lento (o que particularmente não me causa incômodo — o ritmo da vida É lento). Curioso como, ao assisti-lo, fica impossível negar a impaciência que sentimos nas longas cenas iniciais de respiração, contemplação, na filmagem em ângulo fechadíssimo que assinala as primeiras imagens provocando tons de angústia em quem vê.
A delicada construção da narrativa não linear, em conjunto com imagens captadas em estética lo-fi, vagarosamente nos arrebata em uma mistura inebriante de nostalgia e tensão. Esse clima cativa o expectador, pouco a pouco, a partir do desenvolvimento de situações corriqueiras e, ao mesmo tempo, relevantes.
O filme toca em vivências comuns ao adolescer, sem pieguice — é possível imaginar com uma clareza transparente o pensamento das personagens por nos identificarmos com um, com outra, ou com os dois.
Mostra alguns pontos-chave da passagem da infância para a adolescência, com ênfase no tédio — tédio este que é combustível para a criatividade (aliás, assunto para uma outra news: o que serão das crianças sem o tédio, que é preenchido na sua completude por telas mil? Como fica a capacidade de encontrar diversão nas pequenas coisas: nas sombras, no tatu-bola, nas pedras do jardim?)
A obra traz dois assuntos recorrentes na produção fotográfica: a passagem do tempo e a memória. A história é, em alguns momentos, difusa. Lembra um sonho seletivo e confuso (bem como a nossa memória). E é lindo como pequenas lembranças da passagem do tempo se fazem presentes: o momento em que as personagens fazem uma foto polaroid é um marco importante. Vale destacar aqui que a polaroid se faz instantânea, única e efêmera, se desmanchando lentamente à medida que é exposta à luz ao longo dos anos. Ela se assemelha à nossa memória, inexata, subjetiva, que se apaga.
“O esquecer faz parte do processo de desabituar o olhar perante o que foi esquecido”. Escutei essa frase hoje, na última aula do módulo Estudos da Imagem, do curso A fotografia expandida. Foi trazida pelo querido professor Brunno Almeida Maia.
Alguns podem se irritar com este filme. Explico: a lindíssima experiência não se encerra em si. Citando uma frase da querida companheira de cineclube Danielle Pereira, ‘este é um filme iceberg’ — o que enxergamos é só uma pontinha da reflexão.
A cineasta entrega pouca informação sobre os problemas e situações vividas pelas personagens — ao mesmo tempo que nos envolve intimamente com os seus sentimentos, angústias, felicidades e curiosidades fragmentadas. Como quase toda boa obra, deixa espaço para que a memória intrínseca a cada um complete as lacunas deste belo e tocante filme.
💡 Se você gostou da dica, deixo uma segunda recomendação: um dos meus filmes favoritos, dirigido por Sofia Coppola: encontros e desencontros:
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Raquel Pellicano
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