A fotografia vernacular é aquela de caráter amador, encontrada em arquivos pessoais e álbuns - os mesmos que você deve ter guardados em algum cantinho. Podem ser fotografias antigas tiradas por alguém da família, registros do quotidiano, comemorações, viagens e até os acidentes fotográficos... esses são assuntos e detalhes recorrentes nas imagens vernaculares, independente de suas origens - aliás, todo mundo se identifica com uma fotografia vernacular, já que elas costumam trazer partes congeladas de memórias que são comuns na vivência humana.
As fotos assim chamadas, foram realizadas sem o intuito de serem mostradas ao público geral, são uma forma íntima de documentação da vida que teoricamente não sai do círculo familiar. As receitas de família entram neste mesmo conceito, de receitas vernaculares.
🎬 Na Apple TV encontrei esse curta, A mulher que comeu fotografias, com a Nicole Kidman, baseado no conto de uma escritora irlandesa. Apesar de um tanto bizarro, gostei da reflexão antropofágica da mulher que se viu viciada em ingerir fotografias quando descobriu nesse hábito a mágica de reviver suas memórias mais importantes.
💡Me peguei refletindo acerca dessa nova imagem vernacular, realizada com o celular, meio sem pensar, de qualquer jeito, em grandes quantidades. Antes a minha mãe tinha toda uma preparação pra fazer esses registros, já que fotografar era um assunto muito sério e caro.
Será que no futuro teremos o mesmo sentimento que vivenciávamos ao abrir um álbum fotográfico com essas fotografias digitais? Algo em mim diz que isso se perderá. Mas outro algo também me fala que arranjaremos outras formas de eternizar essas memórias, e talvez seja possível um mergulho muito mais intenso e multimídia, com vozes e sons, imagens projetadas em um óculo 3D. Viagem minha? Saberemos em alguns anos.
Para além da discussão atual do quanto compartilhamos/devemos compartilhar de nossas vidas nos meios digitais, quero falar um pouco mais sobre o ato do fotógrafo flaneur - e a criação de diários fotográficos.
Sobre enxergar diferente
No livro o Caminho do Artista, de Julia Cameron, ela propõe e defende um exercício de registro: as morning pages - o ato de sentar e escrever sem autocrítica e sem barreiras de forma diária, 3 páginas, pela manhã. Sem nenhuma intenção de publicação ou divulgação dessa escrita, esse é apenas um trabalho pessoal. Dá pra ouvir uma review super interessante sobre o livro nesse podcast.
Quero aproveitar esse gancho para defender o hábito da fotografia vernacular - há muito tempo nossos celulares são ferramentas para registros diários, mas você faz algo além da selfie na egotrip? A manutenção de um diário fotográfico nos ajuda a enxergar o mundo como turistas - para isso, é preciso deslocar-se de uma visão viciada da rotina. Ficamos cegos aos detalhes. Não percebemos sutilezas como uma luz diferente, um objeto curioso: tudo vira paisagem transparente.
O exercício aguça a percepção e o olhar fotográfico, nos transformando novamente em turistas da nossa realidade. Uma ajuda que eu tive para manutenção de um diário veio do aplicativo para celular, gratuito e fácil, Hypocam. Enxergar em preto e branco, apesar de não ser exatamente a minha estética recorrente de forma comercial, me ajudou a mudar a perspectiva diante das cenas do dia a dia. Você já manteve um diário?
📣 Pausa para novidades importantes no f/508:
Um boletim geral do que andamos preparando por aqui, pra você ficar bem informado:
📰 neste ciclo do Passaporte Cultural, com o novo Projeto Boomerang, entregamos 14 novas bolsas de estudo para alunos de baixa-renda.
📰 o próximo ciclo do nosso projeto multidisciplinar Passaporte Cultural está com a lista de espera aberta para pré-reservas de vaga. Ele abrirá inscrições em dezembro e começará em janeiro/2023 (corre que já é quase Natal! rs)
📰 lançamos hoje um novo curso de pós graduação assinado pelo f/508: Linguagem audiovisual: ferramentas contemporâneas. Promete ser incrível!
📰 a pós graduação Em fotografia como suporte para a imaginação irá para a sua 6a turma consecutiva em março de 2023, e já restam poucas vagas…
📰 agora você pode realizar consultorias individuais com vários dos nossos professores! Saiba tudo sobre aqui.
📰 se liga: hoje é o último dia para usar o cupom SEMANADAFOTO com 15% de desc. em todos os cursos livres de curta duração disponíveis no nosso site.
✨Inspiração + ideias
O Maurício Sapata tem um trabalho lindo de colorização manual - já ouviu falar na técnica? Ela foi muito usada na época em que a fotografia era só PB, e proporciona todo um ar especial às imagens. Também vale acompanhar o outro instagram dele, só de processos históricos e alternativos na fotografia.
🪑 Minha ideia extra pra você é que se aproprie de fotografias vernaculares para uma criação a partir da apropriação + desconstrução e reconstrução dessas imagens. Busque escaneá-las e imprimi-las novamente, assim poderá manter as originais (e não levará uma bronca da sua mãe ou da sua avó rs).
✨Curadoria semanal de links e conteúdos deliciosos f508
👁️ A Sarah Jarrett tem um lindo trabalho com colagens a partir da apropriação de fotografias e obras de arte. É estranho, agoniante, instigante.
👁️ Também a Marjolein Burbank faz obras interessantíssimas a partir da apropriação de imagens.
👁️A Carolle Benitah trabalha com bordados em fotografias antigas e recria suas memórias em produções cheias de drama.
Ainda na atmosfera melancólica
🎧 Se você, como eu, ama uma boa música para produzir, deixo essa forte recomendação. Um dos álbuns mais lindos que eu já escutei na vida: Carrie & Lowell é um álbum memorial de Sufjan Stevens para sua mãe, que morreu em 2012, uma criação de musicalidade inigualável.
✨A inteligência artificial não te convence? Fiz uma série de 18 não-fotografias de memórias um não-fotógrafo, toda produzida em co-autoria com a ferramenta. Está disponível aqui. Acredito muito que essas imagens carregam um pedacinho da minha alma. Me conta aqui nos comentários: o que você achou?
Lembro que, se você quiser tentar, eu fiz esse passo a passo pra quem deseja começar e não sabe exatamente como.
É isso, queridos! Espero que tenham terminado essa leitura mais inspirados e animados para a semana que começa. Gostou do que encontrou aqui? Encaminhe para um amigo, recomende! Isso significa muito pra gente. Beijinhos e até a próxima,
Raquel Pellicano
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