Livros que moram com a gente
Reflexões sobre memória, criação e beleza nas bordas das coisas
💡Antes de começar essa cartinha, preciso te contar: apenas até segunda-feira, 14/07, você poderá se inscrever para o ciclo 2 dos núcleos de estudo continuado e online do f508.
O eixo temático da ‘memória’ atravessa boa parte das propostas formativas, servindo como fio condutor para criações, investigações e reflexões. Mais do que reconstituir o passado, tratamos a memória como um território de disputa, invenção e elaboração visual.
Das fotografias vernaculares às narrativas da infância, dos arquivos familiares à poética do corpo, cada curso convida os participantes a olhar para sua própria história - e para os modos como as imagens ajudam a construir, preservar ou transformar essas narrativas.
🌿 Quando decidi mudar de país, vim para Portugal com duas malas.
Entre tudo o que deixei, talvez nada tenha me doído tanto quanto abrir mão da nossa biblioteca. Eram livros raros da Cosac Naify, edições esgotadas de teoria da imagem, títulos com anotações nas margens, sublinhados de outras fases da vida. Livros que me ensinaram a pensar, que me ensinaram a ver. Aprendi, com uma professora da faculdade, a riscar e anotar nos livros sem dó (e nunca me arrependi).
Levar tudo para outro continente parecia impossível (só depois descobri que existia uma forma de mandá-los por caixas econômicas). A estante lisboeta ficou vazia. Desde então, venho reconstruindo minha biblioteca pessoal devagarinho.
Cada viagem ao Brasil vira uma pequena operação para fazer o peso da mala de volta comportar livros grandes e pequenos. Cada amigo ou familiar que vem visitar, já traz consigo um pequeno kit brasileiro de quinquilharias muito necessárias: uma caixa de Dorflex, um par de Havaianas, um chocolate com Cupuaçu, um livro. Vou pedindo para as pessoas mais próximas, aqui e ali. E assim a nova estante vai ganhando forma, a casa vai se transformando em um novo lar, com alma.
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Nesses últimos tempos, tenho voltado meus olhos para leituras que falam de criatividade (não só como técnica ou ferramenta, mas como uma forma de viver).
Tenho buscado livros que me façam respirar melhor, que me deem algum tipo de trégua mental. E confesso: às vezes me bate um medo real: o medo de não dar tempo de ler tudo o que eu gostaria. Já deixei livros que pretendia ler para trás uma vez, não quero repetir a mesma sensação no corpo.
Ler tem sido, para mim, um tipo de resistência. Uma escolha ativa, um gesto contra o algoritmo, contra a ansiedade, contra o rolar infinito do Instagram. Nem sempre consigo. Mas quando é possível, algo se alinha por dentro.
📖 Nos próximos dias, vou compartilhar por aqui uma lista dos livros que têm me feito companhia nessa fase.
Você vai encontrar todos eles na lojinha do f508 na Amazon. Fizemos uma curadoria bonita, de muitos livros mais especiais que temos/já tivemos nas nossas estantes. Inspiração para criar e pensar a imagem, o fazer criativo, a arte.
#01: Ensaios fotográficos, por Manoel de Barros
Neste livro, Manoel de Barros troca a câmera pela palavra para construir um álbum feito de encantamento, memória e desvio. Em Ensaios fotográficos, o poeta mergulha no “reino da despalavra” e revela imagens que não se veem com os olhos, mas com o silêncio, como se cada poema fosse uma fotografia tirada por dentro. Dividido em duas partes, Ensaios fotográficos e Álbum de família, o livro nos presenteia com uma escrita essencial e profundamente visual, capaz de tornar visíveis as delicadezas do mundo natural, as ruínas da infância e os rastros do tempo.
É uma leitura para quem enxerga na linguagem uma forma de reaprender a ver e para quem encontra beleza nas coisas pequenas e fora de lugar.
#02: Artful Memories, por Jane Chipp
Artful Memories: How to create unique art with old photographs é um convite visual e sensível para transformar fotografias antigas em obras cheias de afeto e significado. Escrito em inglês por Jane Chipp e Jack Ravi, o livro reúne tutoriais passo a passo, referências poéticas e mais de 125 criações autorais e de artistas do mundo todo, todas feitas a partir de fotografias encontradas.
Combinando técnicas de colagem, costura, pintura e montagem em 3D, os autores ensinam como escolher, preparar e reinventar imagens antigas, sejam elas de familiares ou desconhecidos. Mais do que um manual técnico, é uma experiência quase meditativa, que resgata memórias e nos lembra que as imagens carregam histórias que ainda podem ser contadas de novos jeitos.
Dica: este livro tem TUDO a ver com o ciclo 2 do núcleo de fotografia do f508.
#03 Chema Madoz: PHotoBolsillo, por Chema Madoz
Neste volume da coleção PHotoBolsillo, somos apresentados à poética visual do fotógrafo espanhol Chema Madoz. Suas imagens em preto e branco combinam precisão técnica com um senso de humor sutil e refinado. São naturezas-mortas surrealistas que jogam com a lógica das coisas, como uma colher que projeta a sombra de um garfo ou um palito de fósforo queimado que se transforma no bulbo de um termômetro.
Cada fotografia é uma pequena armadilha para o olhar, uma forma silenciosa de nos fazer repensar os objetos mais comuns do cotidiano. Ideal para quem se interessa por metáforas visuais e pelo encantamento escondido no simples.
#04. Wabi-Sabi para artistas, designers, poetas e filósofos, de Leonard Koren
Este pequeno livro de Leonard Koren é, ao mesmo tempo, delicado e profundo. Wabi-Sabi para artistas, designers, poetas e filósofos nos apresenta uma estética japonesa que celebra o imperfeito, o impermanente e o incompleto. Em contraste com os ideais ocidentais de perfeição, o wabi-sabi nos convida a encontrar beleza na simplicidade, no desgaste do tempo, nas bordas tortas das coisas vividas.
Não é um manual. É um sopro de pensamento. Uma leitura para quem deseja desacelerar o olhar e reencontrar sentido no que é modesto, transitório, silencioso. Ideal para quem sente que a beleza também pode estar nas coisas que não brilham.
🫀 Todos os livros recomendados nessa newsletter estão disponíveis na lojinha do f/508 na Amazon, junto com outros títulos incríveis. Ao comprar por meio dos nossos links, você não paga nada a mais por isso, mas apoia diretamente o nosso projeto independente. Obrigada por caminhar com a gente.
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Raquel Pellicano
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Lindo e estimulante artigo. Como sempre.
Sugiro porém utilizar livrarias locais em vez da plataforma amazon que lucra encima de exploração ambiental e dos trabalhadores.